Entrevista: Victor Sol
XJacks: insect commander
Victor Sol já mereceu um post aqui. Em arrumações recentes descobrimos parte de uma entrevista feita ao vivo. Falámos com ele em Junho de 1995, em Barcelona, durante a segunda edição do Sónar onde estava programado como DJ, à tarde e ao ar livre. Por esses dias foi posto a circular o número zero da Self, uma publicação dedicada a música electrónica e para a qual escreveu um artigo em que comentava várias edições então recentes, num período em que já se sentia a saturação da cena Ambient Techno. O seu nome jornalístico era The Angriest Dog-Jockey In the World.
Victor Sol: Em relação, por exemplo, a «I Care Because You Do» de Aphex Twin, houve pessoas que ficaram com má impressão do disco após terem lido o meu texto, mas o facto é que gosto imenso do disco. Quanto aos Future Sound Of London, não gosto mesmo, embora tenha visto outro dia na televisão um video que achei bastante bom. Penso que eles têm bons álbuns, mas não gosto deste e resolvi criticá-los assim porque anda toda a gente a elogiá-los. Há vários aspectos deste circuito que me desiludem bastante. Sinto frequentemente que as pessoas fingem ter interesse, quando na verdade o interesse não existe. Não me importo que as coisas estejam na moda, até gosto de coisas populares, mas o que acontece com muitos destes grupos é que eles não se incomodariam a criar música se não fizessem dinheiro com ela... Ainda recentemente disse a um amigo que acho que muita gente faz música porque está aborrecida. Ok, mas então façam a música em casa para prazer próprio e não a editem. Muitas vezes não sei dizer se o que faço é relevante. Sou muito crítico em relação ao meu trabalho, e talvez por isso seja igualmente crítico com o de outras pessoas. E há toneladas de coisas a ser editadas. Também me sinto um pouco revoltado porque existe muita música boa que... Por exemplo, gosto imenso de Ken Ishii. Trabalha num escritório e disse-me que faz música no seu tempo livre. Os discos que grava não têm qualquer preocupação comercial e ele só faz mil cópias. Porque é que é tão difícil vender mil cópias?
A Fax também só edita mil cópias de cada disco...
Sim, mas vende-as rapidamente. A Fax vende sobretudo devido ao nome, e há coleccionadores que não se importam muito com a qualidade da música.
Não achas que é exagerado editar um disco por...
Por semana. No mínimo.
Não podem ser todos bons.
Não são, é verdade.
Disseste antes que muita gente faz música porque se sente aborrecida. Achas que é esse o caso do Namlook?
Não. Acho que o Peter tem mesmo uma visão especial sobre aquilo que faz. Conheço-o bem e sei que ele faz as coisas com entusiasmo. Sinto que se comprasse todos os discos dele ficaria frequentemente desiludido, mas ele tem também coisas óptimas. O disco de que gosto mais, «Aliens In My Suitcase», foi um fracasso de vendas...
Quanto a ti, sentes que tens suficiente liberdade para fazer a música que te apetece?
Completamente. Mas não é necessário que esteja 100% convencido daquilo que faço, porque muitas vezes as pessoas gostam de coisas de que não se pensaria que gostassem. Em XJacks, por exemplo, há um tema chamado «Solid Pressure», Dandy Jack não queria inclui-lo no disco, não gostava do tema. Eu também não estava bem certo porque acho o tema um pouco duro demais.
É o melhor tema...
Mas foi isso que aconteceu, eu sabia que isso ia acontecer.
Tem uma certa violência mas no fim quebra completamente. Não é o que se espera.
Isso é outro aspecto importante para mim. O Peter chateia-se comigo, por vezes. Diz-me para fazer as coisas da forma que as pessoas esperam, porque assim estamos a satisfazer essa necessidade que sentem e vender-se-ão mais discos. Eu respondo-lhe que é precisamente isso que me aborrece. Quando o primeiro disco de +N foi apresentado aqui no Sónar, há um ano, estive a observar algumas pessoas que o ouviam no stand da Rotor. Quase todas iam saltando os temas no CD sem encontrarem aquilo que procuravam. Então punham o disco de lado.
Não é propriamente um disco que possa ser apreendido assim...
Exacto, não se consegue isso. E as pessoas não compram porque não vai de encontro às suas expectativas. Tenho até agora oito discos editados e praticamente ainda nem os vi criticados, o que me entristece. Não é porque pense que sejam algo de extraordinário, mas acho que faço música que até pode ter algum interesse para as pessoas e elas nem sabem que existe. Ponho os discos cá fora e quase não recebo reacções.
Acerca de +N, o Uwe Schmidt disse que a música é essencialmente improvisada.
Sim, tudo o que faço é essencialmente improvisado. No primeiro disco de +N improvisámos a música mas depois gravámo-la para o disco do computador, manipulámo-la, demos-lhe uma forma e, na maior parte dos casos, voltámos a tocar por cima. Assim, a música é improvisada mas também estruturada.
Há duas faixas, «Missing Point 1» e «Missing Point 2» nas quais me parece ouvir CDs danificados, cortados ou algo assim...
Não, na verdade todos os sons nesses dois temas são de Hafler Trio. Quando fazes forward num CD ouves aquele clic clic e foi isso que nós gravámos. Um CD de Hafler Trio inclui um booklet com uma pergunta dirigida a quem lê: deverá procurar um ponto oculto. Então o que nós tentámos fazer foi encontrar esse ponto oculto mas na música. Pusemos o CD em forward, deixando-o saltar, colocámos tudo no sampler, transferimos para um teclado e tocámos ao vivo. Eu toquei e o Uwe manipulou os efeitos.
«Ex.S» tem também uma faixa, «Virilio», com um efeito físico extraordinário.
É bom sentires isso. A minha música tem um elemento muito físico. Depois, por outro lado, gosto de trabalhar de um modo estimulante para o cérebro.
Foi com XJacks que mais senti isso.
Por acaso é o disco de que mais me orgulho.
Bom, assisti à tua 'actuação' como DJ. Costumas fazer isso regularmente ou foi só para esta ocasião?
Foi a primeira vez. Era suposto ter tocado ao vivo no Sónar, este ano, mas eles esqueceram-se de me incluir no programa. Na verdade nada estava confirmado. Teria tocado com XJacks. Quanto a pôr música, pensei bastante na melhor maneira de o fazer. No início tinha duas ideias: a primeira era não pôr absolutamente nenhum som, manter o silêncio durante todo o tempo, ficar ali com os pratos e leitores de CD ligados e não fazer nada. Mas depois isso seria uma espécie de homenagem a John Cage, o que já foi feito e é desnecessário repetir. A outra ideia era instaurar um completo caos: tudo a tocar ao mesmo tempo, coisas em fade in e fade out, mas depois cheguei aqui, vi as pessoas sentadas nos sofás e no chão e senti que o que ia fazer não era a atitude certa. Então resolvi apenas misturar o máximo possível de coisas, dando às pessoas a hipótese de distinguirem os vários elementos.
Houve uma certa insistência em Kraftwerk...
Se existe um grupo electrónico importante, são eles. A maioria das pessoas que encaram seriamente a música electrónica terão forçosamente de reconhecer a sua importância.
Que outros nomes merecem o teu respeito?
Cluster, por exemplo, acho que eram uma banda brilhante. Tinham um sentido de humor incrível, e eu gosto disso na música. Throbbing Gristle influenciaram-me imenso, não só pela música como pelas ideias. Depois há os Residents, Chrome...
E nomes mais recentes?
Gosto de Richard Kirk, mas acho que ele anda a fazer demasiadas coisas e está a tentar envolver-se muito com o que se passa actualmente. Respeito-o bastante, já desde os tempos de Cabaret Voltaire, e de qualquer forma é positivo que tenha progredido. Adoro Aphex Twin. De toda a música nova escolheria a dele. O que ele faz não é devidamente apreciado pelas pessoas, talvez mais tarde... O último tema de «Ventolin», por exemplo, começa com um ritmo distorcido que depois se transforma numa melodia tipo parque de diversões. Adoro esse tema.
0 Comentários:
Enviar um comentário
<< de volta ao início