Música na Twilight Zone: Whatever We Want
Na Twilight Zone pouco depois de aparecerem nas lojas, as edições da Whatever We Want (Brooklyn, NY) são sempre só para alguns: os mais rápidos e/ou os mais doentes. A raridade dos discos facilita o hype maioritariamente criado assim que se soube que havia música de Harvey na editora, e depois especulava-se que a editora seria de Harvey. Em dois anos criou-se um fenómeno. O site da WeWW tem a mesma mensagem há mais de um ano e, mesmo que não existisse, ninguém interessado teria problemas em saber onde comprar os discos. O preço exorbitante de cada maxi (cerca de 15 euros na maioria das lojas) reforça a exclusividade. Tudo parece pensado para bloquear o grande público e, em reverso, atrair os insectos que estão em cima das coisas. Não há propriamente uma distribuição normal para estes discos que vão directos para algumas lojas no Japão e duas ou três nem sequer na Europa mas apenas em Inglaterra, quase inexistentes nos EUA e, em Portugal, apenas a Flur conseguiu meia dúzia de cópias para satisfazer maioritariamente reservas. Depois a pergunta é: vale o esforço de procura, investigação e, hm, humilhação de pagar 50% mais do que é normal por cada maxi? Ou o facto de precisamente se pagar isso pelos discos obriga a justificar o gasto e a condicionar o gosto? Neste momento, a WeWW, como as melhores editoras de qualquer época, representa uma fatia importante de cultura contemporânea. O regresso às raízes significa "fazer música de dança a partir de música não de dança", mas o contexto é inteiramente outro do que existia em 1970 quando o Loft de David Mancuso começou a funcionar. Agora, a saturação é motivo mais do que suficiente para começar uma operação, virar para outro lado, agir por negação em vez de afirmação. Ou apenas, e aqui já não se pode falar de uma época específica, fazer aquilo que apetece e deixar os outros preocuparem-se com explicações.
Os discos de Map Of Africa e Quiet Village (três maxis cada) desaparecem pouco depois de chegarem às lojas, os primeiros porque têm Harvey, os segundos porque de alguma forma estão no centro de toda a nova cena Baleárica ou assim. Map Of Africa é a banda de Harvey e Thomas Bullock de Rub-N-Tug, e as três edições mostram sempre um lado A rock com traços visíveis de Led Zeppelin (Harvey na voz) e um lado B cósmico e lento, tudo impregnado do espírito surf que Harvey vive e, porque somos sugestionáveis, transmite através da música, aquela coisa de estar em paz e em contacto com o interior ou, nos momentos mais livres, andar por aí com a cabeça ao vento. «Gonna Ride», o último, é descartável até virarmos para o lado B e ouvirmos o mais permanente «Freaky Ways», o segundo melhor tema de Map Of Africa a seguir a «Map Of Africa» e uma das melhores canções ouvidas em 2006.
Quiet Village, às vezes complementado com Project, é a máquina de hype de Matt Edwards e Joel Martin, o primeiro suficientemente metido na pop e techno como Radio Slave, um dos mais aguçados produtores da era mash up a par de Richard X e Erol Alkan, e também, com o nome Rekid, a reformular a cena Cósmica para o presente. Joel Martin acordou verdadeiramente com a série «Ultimate Breaks And Beats», onde aprendeu que todos os géneros de música serviam o hip hop, depois estudou cinema, apaixonou-se por Disco, fundou uma editora com Matt Edwards, gravou uma mixtape chamada «Esoteric Disco», passou discos na festa do 60º aniversário de Eric Clapton e, com Cherrystones (ver Godsy), dedica-se à recuperação de bandas sonoras de filmes underground (compilou a música não editada de «Dawn Of The Dead», por exemplo, e supervisionou a música do recente «Shaun Of The Dead»). Quiet Village pode ou não ter origem em «Quiet Village» de Martin Denny, um dos discos fundamentais da Exotica, e é um pouco disso + zombies, cruzeiros de luxo, praia, filmes de surf, mansões assombradas, tudo em panavision quando se fecham os olhos para ouvir «Fragments Of Fear», a mixtape de QV para o Halloween de 2005. Audio de monstros atormentados, crianças malditas, vampiros sedentos e névoa como no «Nevoeiro» de Carpenter.
Como explicava Carlos Arias, dono da WeWW, "Godsy é Godsy". Os dois maxis na editora são praias de ecos, feedback e cordas de guitarra com memória directa para cenas shoegazer e vapor 4AD vintage. Os drones de Godsy estão numa zona inteirament diferente de Map Of Africa ou QV, e por isso são os únicos WeWW que ainda se encontram nas lojas depois de aqueles esgotarem. Godsy é Cherrystones, misto de Andy Votel e Barry 7 (Add N To X), dedicado a investigar breaks e diamantes psicadélicos (Cher a soar incrível em «I Walk On Gilded Splinters» na compilação «Cherrystones Hidden Charms», que também revelou a estes ouvidos os Shocking Blue). Cherrystones produziu coisas para a Twisted Nerve (lá está, Andy Votel) e Ninja Tune, e a passagem pelo Hip Hop parece inevitável para quem procura breaks a sério e quer fazer alguma coisa em sua homenagem.
Bobbie Marie é o produtor residente da WeWW (Thomas Bullock) e Rene Perez na voz. Três singles também, todos de 7", nenhum brilhante, demasiado rock cowboy, excepto o esmagador «Stay Away», lado B de «Rodeo». O último single apareceu de repente no final de 2006 apenas em lojas japonesas: «Demmie Marie» fez lembrar os novos DFA Prinz Horn Dance School, tão perto quanto o rock pode chegar de ser Jack (bom, uma aproximação disso, pelo menos), bom e seguro, mas «W.W.I.I.L.L.D.», o lado A, é apenas rock para noites de copos entre pessoas com melhor aspecto do que o habitual. Isso não é mau.
Bullock é também Otterman Empire, parece. O primeiro maxi ofereceu Doors e Dire Straits, o segundo inclui «Dharma», não se sabe bem de quem é o original, se é que é um original de alguém, e «Babylon And On», alteração de Aphrodite's Child, um original que Rub-N-Tug usaram em «Campfire» com efeito incrível mas aqui pesadamente filtrado e submetido a um beat Daft Punk que mata tudo. Feio. Mau?
Álbuns de Bobbie Marie e Map Of Africa anunciados há um ano, álbum de Quiet Village licenciado à Virgin para 2007, pode ser o ano em que tudo explode e ficamos a saber se ainda gostamos o suficiente do que está para trás, já que pode acontecer não gostarmos muito do que estará para a frente.
Na colecção ME:
Bobbie Marie «BB Gun» 7" 2005
Bobbie Marie «Rodeo» 7" 2005
Map Of Africa «Black Skinned Blue Eyed Boys» 12" 2005
Otterman Empire «Texas Radio/Private Land» 12" 2005
Quiet Village «Can't Be Beat/Pillow Talk» 12" 2005
V/A «Fragments Of Fear, Mixed With Blood by Quiet Village» CD 2005
Bobbie Marie «W.W.I.I.L.L.D./Demmie Marie» 7" 2006
Godsy 1 12" 2006
Godsy 2 12" 2006
Map Of Africa «Sound Of The Fens» 12" 2006
Otterman Empire «Babylon And On/Dharma» 12" 2006
Quiet Village «Circus Of Horror/Free Rider» 12" 2006
6 Comentários:
major,
esqueceste-te da mixtape "fragments of fear" de quiet village! por aqui roda sem parar em formato pirata,apesar de na sua essência também o ser...
abraço
Claro, claro! Vou rever isto. «Fragments Of Fear» é essencial!
n tenho nem um!quiet village rules.
Eles fizeram uma segunda mixtape Halloween para o beatsinspace.net, há umas semanas, mas era quase upgrade da «Fragments Of Fear», tinha algumas faixas repetidas.
pois,
também aparecia uma outra que já ouvira em "campfire" dos rub n tug.
peca pelas conversas cruzadas pelo meio, mas os interlúdios terroríficos fazem esquecer tudo o resto :)
Preciosidade, os interlúdios. Então aquele na «Fragments Of Fear» em que o mestre ensina ao monstro a diferença entre Bom e Mau e que o Fogo é Bom...
Enviar um comentário
<< de volta ao início